Sem revogação do novo currículo escolar, abandono tende a aumentar
Foto: Agência Brasil
Em um roteiro muito conhecido, da mesma forma que a reforma trabalhista aprovada durante o governo de Michel Temer (MDB) com o argumento mentiroso da geração de empregos, também a reforma do ensino médio trazia a justificativa de tornar a escola um ambiente mais atrativo.
Na prática, porém, as mudanças na etapa escolar implementadas a partir de 2022 com a aprovação da Lei nº 13.415/2017, que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, não cumpriram a proposta de fazer da sala de aula um espaço mais dinâmico e nem de oferecer alternativas aos estudantes que buscam uma preparação técnica voltada ao ingresso no mercado de trabalho.
Com as modificações implementadas, disciplinas básicas como Física, Química e Biologia foram reduzidas. O resultado foi o aumento da evasão escolar e um cenário em que apenas 15% dos estudantes brasileiros com idade acima de 16 anos afirmam estar na escola, conforme apontou pesquisa do Sesi e Senai (Serviço Social da Indústria/Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), em parceria com o Instituto FSB Pesquisa.
A secretária de Assuntos Educacionais da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Guelda Andrade, avalia que a pandemia de Covid-19 contribuiu para aumentar o abandono, mas afirma que o Novo Ensino Médio foi fundamental para intensificar o desinteresse pela escola.
Segundo aponta, o Novo Ensino Médio é incapaz de formar o estudante para a vida e para o mercado de trabalho, o modelo ajudou a expulsar quem já sofria a pressão de trabalhar para ajudar em casa.
“Além do coronavírus, há outros fatores impactantes para esses números assustadores, como o Estado não pensar o conceito de acesso à escola associado ao tripé de garantia de matrícula e oferta de vagas, permanência e qualidade da formação oferecida”, explica Guelda.
Fator econômico
De acordo com a pesquisa do Sesi e do Senai, 57% das pessoas que abandonaram a sala de aula fizeram porque não tinham condições de seguir e a necessidade de trabalhar (47%) é a razão principal.
O educador e cientista político Daniel Cara avalia que, diante de disciplinas pouco impactantes para a vida dos estudantes, a opção de trabalhar ao invés de concluir os estudos se torna um caminho natural.
“As famílias foram prejudicadas desde o governo Temer por uma medida econômica que afetou muito aos mais pobres e esse prejuízo acaba gerando necessidade dos/as estudantes ingressarem precocemente no mercado de trabalho. Eles sabem que não têm tempo a perder na vida com disciplinas completamente sem sentido. O que deveria ser algo para mantê-los na escola é tão equivocado e absurdo, na forma como foi construído e descontextualizado da rotina da escola, que gera evasão”, critica.
Educação é a saída
Mesmo com todas as dificuldades e a necessidade de ampliação do investimento, a educação ainda é considerada pela maioria dos brasileiros e brasileiras como a chave para resolver problemas sociais, conforme aponta levantamento realizado pela Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec), a pedido da organização Todos Pela Educação.
Segundo os números, 94% das pessoas concordam que o ensino de qualidade deveria estar entre as três prioridades dos governadores/as e 60% acreditam que vai melhorar nos próximos quatro anos.
Para Guelda, as/os professoras/es são peças fundamentais para transformar essa realidade e coibir a evasão com aulas mais atrativas. Mas lembra que, para isso, também dependem de contínua formação, uma responsabilidade dos gestores públicos.
“O Estado precisa garantir estrutura com laboratórios, boa biblioteca, além da constante preparação de quem está à frente das salas de aula e uma organização curricular capaz de oferecer o desenvolvimento de todas as potencialidades desse estudante. Educação integral não é apenas educação em tempo integral, que apenas amplia o tempo na escola com a oferta de mais do mesmo. Mas sim uma educação que tenha mais música, mais teatro, mais dança, diversas modalidades esportivas. Que dialogue sobre política, religião e economia, isso é educação que trabalha o desenvolvimento pleno do ser humano”, defende a dirigente.