RESISTÊNCIA Conselho Nacional de Entidades da CNTE busca estratégia unificada para a valorização da categoria

Foto: Renato Braga

O Conselho Nacional de Entidades (CNE) da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) se reúne nesta quinta (9) e sexta (10) para debater estratégias para promover a valorização da categoria e unificar a agenda de lutas da educação pública no Brasil. O encontro acontece em Brasília (DF) e começou com uma ampla análise de conjuntura sobre o ambiente político nacional.

O jornalista e mestre em políticas públicas e governo, Antônio Augusto de Queiroz, foi convidado para falar sobre o peso da eleição do presidente Lula nas lutas educacionais. Na avaliação dele, a destruição causada pelo governo Bolsonaro foi imensa seja pela crise humanitária na Terra Indígena Yanomami, no uso da força na depredação dos palácios, ou nos casos de corrupção no uso do cartão corporativo.

O governo Lula recebeu esse ambiente que requer muita cautela, mas é possível retomar os espaços de diálogo. “Podemos reconstruir o aparelho do Estado, para que possamos construir um governo consolidado e próspero não só para a transição. Nenhum governo tem tanta capilaridade como esse. Todo ministério tem uma porta para os setores excluídos socialmente e vários espaços de diálogo que serão importantes para o país e para a reinserção do movimento sindical, que estava deslegitimado”, pontuou.

Erika Moreira Martins na reunião do CNE | Foto: Renato Braga

Influência dos setores empresariais na educação

A doutora em educação, Erika Moreira Martins, apresentou um breve histórico da presença de grupos empresariais nos espaços de construção de políticas públicas de educação, desde o contexto da redemocratização do Brasil. Ela destaca que durante o governo de Fernando Henrique Cardoso houve uma alteração legal e grande legitimação das Organizações Não Governamentais (ONGs) e entidades de atuação pública não estatal. “O Estado renunciava a alguns serviços, terceirizando para ongs e empresas. Os empresários começaram a perceber que eles precisavam continuar com a expansão de seus negócios”.

A pesquisadora conta que esses empresários se reorganizaram e formularam novas estratégias. “Antes do primeiro turno de 2002, um grupo composto por mais de 100 empresários assinaram manifesto de apoio ao Lula”, relata Érika. Na visão dela, os empresários que atuavam de maneira fragmentada começaram a se organizar em coalizão: “É a chave para a gente entender a capacidade de incidência. Na coalizão não está presente só fundações e institutos, mas sim instituições do Estado. Pessoas que vão levando essas ideias para os campos de decisão”.

Erika Moreira relata que a entidade ‘Todos pela Educação’ foi lançada em 2006, como uma aliança nacional apartidária - com Itaú, Fundação Roberto Marinho, Fundação Lemman - apresentando para a sociedade algumas metas, com enunciados de um campo que vinha da esquerda: ‘Todas as crianças na escola’. A pesquisadora aponta que esses enunciados escondem como atingir essas metas, que são as políticas que estão sendo alteradas nos últimos anos.

“Esse ator empresarial ganhou um espaço que o sindicato não tem conseguido alcançar. Primeiro foi o Plano de Desenvolvimento da Educação que já explicitava esse alinhamento com o poder executivo. E temos o IDEB que conjuga desempenho e fluxo escolar, que são duas metas do Todos Pela Educação. Mais do que fazer lobby, o PDE pelos fundadores representou entrelaçamento entre estados e empresários. Essa pauta empresarial passou a fazer parte do governo nesse determinado momento”, explica Érika.


Quem governa a educação?

Na visão da pesquisadora, a escola pública brasileira representa um nicho importante para o mercado privado – material didático, consultorias – mas não é só isso. “Os grupos empresariais buscam implantar uma ideologia no espaço de socialização das escolas – projetos de vida, empreendedorismo, meritocracia – tudo isso está presente. Não se trata de privatização pública ou de vendas. É uma cooptação de todos os aspectos da educação pública. Também tem a ver com redes de poder, essas redes vão potencializando uma incidência e ofuscando um antagonismo de projetos. Se fazem acordos, passam uma ideia de que é possível conciliar práticas de mercado com justiça social”, alerta Erika Moreira.

Ao final da exposição, Erika conclama: “Esse é o momento de início de governo, de mobilização, de ocupação de espaços, de agendas. Nem sempre um confrontamento direto, mas é preciso ampliar a participação popular organizada dos professores e enfrentar esse movimento ‘monitorizado’ da sociedade”.

Concepção da educação

O presidente da CNTE, Heleno Araújo, reforçou: “Ganhar as eleições com Lula é a coisa mais acertada que fizemos. Com esse retorno nós precisamos marcar bem a posição. Porque queremos que dê certo, mas não dá para aceitar uma concepção privatista dentro da educação”.

O dirigente da CNTE fez uma longa apresentação dos modelos de educação que o atual governo diz querer reproduzir em todo o país e que na opinião da CNTE, são problemáticos. “Nós vamos pedir uma audiência com o presidente Lula e vamos dizer os motivos pelos quais não concordamos com aquilo. Ceará, Pernambuco e Espírito Santo têm experiências colocadas como referência de qualidade e isso nos preocupa” enfatiza Heleno.

Um exemplo desse problema é o que eles chamam de ‘alfabetização na idade certa”, que tem fechado turmas de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Outra questão é o direito de aprendizagem utilizado pelo setor empresarial, que não exige profissional da educação, e considera suficiente alguém com notório saber. “Não precisa ter a sala de aula, 40% do currículo pode ser à distância. Então atenção e cuidado. Muitos nos acusam de ser contra alfabetizar na idade certa. Mas não é isso. Nós somos a favor que todos sejam alfabetizados. A queda do analfabetismo está acontecendo pela morte de pessoas mais velhas e não pela ação do estado. Precisamos dialogar com a base para que ela entenda a nossa crítica”, explica Heleno Araújo.

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