Foto: Marcello Casal/Agência Brasil
O próximo governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) terá como um dos principais desafios colocar a educação pública no Brasil como vetor no combate ao racismo nas escolas. Essa é a opinião de Gabriela Mendonça, pedagoga, produtora cultural e uma das fundadoras da Jangada Escola no Rio de Janeiro, uma comunidade escolar que acredita na pedagogia do encontro e do fazer coletivo.
“Será necessário priorizar o combate ao racismo, intensificar e ampliar os investimentos públicos para que a ampliação da lei 10.639/03, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira, seja efetiva”, diz Mendonça, que ajuda na implementação de programa de letramento racial em comunidades.
Segundo ela, para isso ocorrer, o novo governo eleito vai precisar de “espaços amplos de debate e sensibilização no âmbito das gestões públicas e privadas, na formação de professores e adequação dos materiais e ferramentas pedagógicas disponíveis nas escolas”.
Novos ventos
A partir de janeiro de 2023, novos ventos trazem a Brasília a esperança de reverter os desastres na área durante os quatro anos da gestão de Jair Bolsonaro (PL).
Nos últimos anos, houve um crescimento de crianças não alfabetizadas e a maior parte foi entre alunos negros e pardos do que em estudantes brancos, segundo dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio) Contínua Educação 2019, divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O analfabetismo entre negros é três vezes maior do que os brancos.
De acordo com a pedagoga, isso ainda é fruto do racismo estrutural no Brasil que se organiza de diversas formas, inclusive nas escolas. O Racismo estrutural é um conjunto de práticas discriminatórias, institucionais, históricas e culturais dentro de uma sociedade que frequentemente privilegia algumas raças em detrimento de outras.
“Podemos, através da educação, desconstruir o mito da democracia racial. É um processo urgente e importantíssimo para reformulação do imaginário sobre igualdade e direitos, reconhecimento de privilégios e consequente e construção de práticas antirracistas dentro e fora das escolas, diz Gabriela.
Projetos contra o racismo na grade curricular
Para a pedagoga, além do cumprimento da lei 11.645/08, que torna obrigatório o estudo da história e cultura indígena e afro-brasileira nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, e sua consequente adequação curricular no ensino básico, é preciso colocar na grade curricular as linguagens artísticas, em especial a literatura, que criam oportunidades para práticas educacionais antirracistas.
“Faz-se necessário, porém, qualificar o olhar para a escolha dos títulos e atividades da escola e, para isso, acredito que inserir o letramento racial na formação inicial e continuada dos professores seja vital para uma atuação autônoma e verdadeiramente comprometida com a questão racial o ano todo”, pontua a professora.
Racismo e educação
Um levantamento feito pela ONG Todos pela Educação, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os percentuais de crianças pretas e pardas de 6 e 7 anos de idade que não sabiam ler e escrever passaram de 28,8% e 28,2% em 2019 para 47,4% e 44,5% em 2021, respectivamente.
Já o aumento do índice de não alfabetização em crianças brancas foi menor, de 20,3% para 35,1% no mesmo período. Isso acontece, segundo a professora, porque a escravidão no Brasil deixou sequelas profundas de desigualdades que acompanham a sociedade até hoje.
E para ampliar ainda mais a desigualdade, durante a pandemia de Covid-19, alunos/as negros/as e pobres foram os mais prejudicados com fechamento das escolas e sem acesso à internet e materiais didáticos. Gabriela explica que os temas do racismo e da educação se cruzam porque a sociedade brasileira precisa aprender sobre o que são relações sociais e sobre como a gente pode desenhar as relações raciais de igualdade. "Os dados mostram que o racismo e a educação no Brasil andam juntos, e que o racismo impacta na garantia do direito à educação das pessoas negras", pontua.