Assis Cavalcante/Prefeitura de Sorocaba (SP)
O decreto 10.502 de Jair Bolsonaro, publicado em setembro de 2020, instituiu a Política Nacional de Educação Especial e no mesmo ano foi considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A medida está suspensa devido a denúncia feita por diversas entidades e organizações da sociedade civil de que a medida segrega crianças com deficiências nas escolas e desrespeita todas as leis da educação inclusiva.
A questão é que o decreto 10.502 tem sido utilizado indiscriminadamente para se recusar matrículas de pessoas com deficiência, tanto na rede pública quanto na rede privada. Isso ocorre porque o site do Ministério da Educação continua, até o momento, mantendo o material didático, como uma cartilha, com orientações para municípios e estados sobre a implementação da política que está inválida, devido a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6590).
Um dos coordenadores do Coletivo Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras com Deficiências da CUT, Carlos Maciel, disse que este decreto de Bolsonaro não dialoga com as leis anteriores e vigentes como outros atos normativos, sobretudo os decretos 7.611/11 e 7.612/11, desrespeita todas as leis que tratam o assunto da educação inclusiva, inclusive a Convenção Internacional de Direitos da Pessoa com Deficiência que deu origem ao Estatuto da Pessoa com Deficiência LBI Lei 13.146/15.
“Além de ser um retrocesso na conquista da inclusão das pessoas com deficiência, esse decreto de Bolsonaro abre espaço para tirar ainda mais investimento da educação pública, quando se fala na criação de novas turmas e escolas. O decreto não especifica como seria e nem com quem seria a criação desses espaços específicos para este público. Independente disso, o que precisamos de fato é de investimento na educação pública para que as escolas tenham plenas condições de ampliar o ensino inclusivo”, explicou.
Uma das ações de fortalecimento da ADI foi a campanha “Eu não atrapalho”, da Coalizão Pela Educação Inclusiva, que surgiu em resposta às manifestações do ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro, quando ele falou contra a presença de estudantes com deficiência no ensino regular. O governo defende que alunos especiais participem das aulas em salas separadas.
Para Carlos, a segregação existe, ainda mais quando o governo deixa de investir em acessibilidade nas escolas públicas e nas condições de vida para as pessoas com deficiência essa segregação tende a aumentar. Na visão dele, nos últimos anos é justamente isso que o atual Governo tem feito. O Relatório da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados revela que o Programa Escola Acessível, por exemplo, cumpriu apenas 12% da meta entre os anos de 2019 e 2021. Mesmo depois do auge da pandemia, os investimentos não aumentaram.
“Quando não há investimento, como construção de escolas acessíveis, contratação de pessoal para dar suporte técnico aos educadores e estudantes, conforme previsto em lei, formação continuada dos professores, retirada das diversas barreiras, arquitetônicas, atitudinais, o capacitismo entre outros, fica praticamente impossível atender a comunidade com os direitos previsto em Lei”, ressalta ele, que complementa: “Com a falta de investimento na educação e o aumento da demanda que é diária, significa que caminhamos para o colapso da educação pública e inclusiva”.
Revogar o decreto é necessário
O ensino inclusivo é preceito constitucional e a escola é o primeiro espaço de interação e participação social. Sem educação inclusiva não há inclusão de pessoas com deficiência. A Coalizão Brasileira pela Educação Inclusiva, composta por mais de 50 organizações, defende no livro 'Pela Inclusão: os argumentos favoráveis à educação inclusiva e pela inconstitucionalidade do Decreto nº 10.502/2020'.
A publicação reúne artigos de organizações, militantes, juristas, pesquisadores com e sem deficiência que participaram em agosto de 2021 da audiência pública no STF que julgou a ADI 6.590/DF sobre a constitucionalidade do decreto.
Em nota, a CUT afirma que não pactua com uma suposta nova Política de Educação Especial que tira a responsabilidade do Estado em prover o ensino regular de todos os recursos e meios necessários à inclusão, e remete o atendimento para “Escolas Especiais”, beneficiando um modelo de educação excludente e segregador das pessoas com deficiência. “É preciso revogar esse decreto”, diz trecho do documento.