Foto: Uanderson Fernandes/ Ascom - Seeduc-RJ
O fim do ano se aproxima e uma pseudo incerteza se instala em parte dos entes federados (estados e municípios), a respeito do cumprimento integral da Emenda Constitucional nº 108 e da Lei 14.113, que a regulamentou. Trata-se do repasse integral do percentual mínimo de 70% dos recursos do Fundo da Educação Básica – FUNDEB para o pagamento de salários aos profissionais da educação.
Vejamos o que diz o ordenamento legal:
Art. 212-A, inciso XI da Constituição Federal: “proporção não inferior a 70% (setenta por cento) de cada fundo referido no inciso I do caput deste artigo, excluídos os recursos de que trata a alínea "c" do inciso V do caput deste artigo, será destinada ao pagamento dos profissionais da educação básica em efetivo exercício, observado, em relação aos recursos previstos na alínea "b" do inciso V do caput deste artigo, o percentual mínimo de 15% (quinze por cento) para despesas de capital;”
Art. 26 da Lei 14.113: “Excluídos os recursos de que trata o inciso III do caput do art. 5º desta Lei, proporção não inferior a 70% (setenta por cento) dos recursos anuais totais dos Fundos referidos no art. 1º desta Lei será destinada ao pagamento, em cada rede de ensino, da remuneração dos profissionais da educação básica em efetivo exercício.
Parágrafo único. Para os fins do disposto no caput deste artigo, considera-se:
I - remuneração: o total de pagamentos devidos aos profissionais da educação básica em decorrência do efetivo exercício em cargo, emprego ou função, integrantes da estrutura, quadro ou tabela de servidores do Estado, do Distrito Federal ou do Município, conforme o caso, inclusive os encargos sociais incidentes;
II - profissionais da educação básica: aqueles definidos nos termos do art. 61 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 , bem como aqueles profissionais referidos no art. 1º da Lei nº 13.935, de 11 de dezembro de 2019, em efetivo exercício nas redes escolares de educação básica;
III - efetivo exercício: a atuação efetiva no desempenho das atividades dos profissionais referidos no inciso II deste parágrafo associada à regular vinculação contratual, temporária ou estatutária com o ente governamental que o remunera, não descaracterizada por eventuais afastamentos temporários previstos em lei com ônus para o empregador que não impliquem rompimento da relação jurídica existente.”
Art. 25 da Lei 14.113: “Os recursos dos Fundos, inclusive aqueles oriundos de complementação da União, serão utilizados pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, no exercício financeiro em que lhes forem creditados, em ações consideradas de manutenção e de desenvolvimento do ensino para a educação básica pública, conforme disposto no art. 70 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. (...)
§ 3º Até 10% (dez por cento) dos recursos recebidos à conta dos Fundos, inclusive relativos à complementação da União, nos termos do § 2º do art. 16 desta Lei, poderão ser utilizados no primeiro quadrimestre do exercício imediatamente subsequente, mediante abertura de crédito adicional.”(grifos nossos).
A colação dos preceitos acima destacados não dão margem às formas de aplicação dos recursos do FUNDEB, sobretudo dos 70% mínimos de subvinculação para salários dos profissionais da educação. E dois podem ser os critérios para a utilização da subvinculação, sendo eles:
1º) Rateio direto aos profissionais da educação, conforme tem ocorrido desde a implantação do Fundo do Ensino Fundamental, a partir de 1998. Nos últimos anos, durante a vigência do Fundeb transitório (EC 53 e Lei 11.494), a fim de ampliar a segurança jurídica do rateio [1], o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que os legislativos locais devem autorizar, através de leis próprias, a forma de se proceder ao rateio. Esta é a única exigência jurídica para se efetivar o rateio, devendo-se observar também os profissionais detentores de tal direito (incisos II e III do art. 26 da Lei 14.113, combinado com o Manual de Orientações do Fundeb, página 47 em diante).
2º) Transferência de até 10% da subvinculação e demais recursos do Fundo para o ano subsequente, a fim de aplicá-los no exercício de 2022. Essa opção pode reforçar o pagamento do reajuste do piso do magistério, até então previsto em 31,3% para o próximo ano, estimulando a valorização das carreiras dos profissionais da educação. Mas ATENÇÃO! Para esse caso, a CNTE orienta duas providências a serem acordadas entre os sindicatos, as gestões públicas e os parlamentos locais: i) abertura de crédito adicional, conforme dispõe o § 3º do art. 25 da Lei 14.113; e ii) autorização expressa do Tribunal de Contas do Estado (ou do Município, onde houver), pois os valores da subvinculação de 2021, mesmo sendo pagos em 2022, compõem a prestação de contas do FUNDEB do ano base da arrecadação (2021). E vale registrar que o STF, em sede de decisão monocrática do ministro Alexandre de Moraes, ainda pendente de julgamento do Pleno (ADI 6450), impediu a concessão de adicionais, reajustes, progressões nas carreiras etc, até 31.12.2021, nos termos do art. 8º da LC 173/2020.
Outra observação IMPORTANTE! O Senado Federal aprovou em 21.09.2021 a PEC 13/202, autorizando a compensação dos recursos de manutenção e desenvolvimento do ensino (arts. 212 e 212-A da CF), dos anos de 2020 e 2021 – em função da pandemia da Covid-193 –, nos exercícios de 2022 e 2023.
Contudo, a redação do Senado excetuou dessa regra compensatória a subvinculação mínima de 70% do FUNDEB destinada ao pagamento dos profissionais da educação. A PEC 13/2021 tramita, neste momento, na Câmara dos Deputados, e caso seja mantido o texto do Senado não restará alternativa aos gestores e aos parlamentos locais senão a efetivação do rateio legal das verbas da subvinculação do FUNDEB neste ano de 2021.
Por fim, a CNTE registra e lamenta que as orientações emitidas pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, a respeito da utilização dos 70% da subvinculação do FUNDEB, até o momento, sejam omissas quanto à forma de repasse desses recursos na condição de rateio aos profissionais da educação, em 2021, criando subterfúgios para a execução correta de um dispositivo constitucional que se pauta na valorização dos profissionais da educação. De modo que requeremos a imediata retificação dos atos normativos da Autarquia que administra o FUNDEB, à luz do princípio da legalidade que rege o direito pátrio.
Neste momento, o Congresso Nacional se debruça sobre a destinação de precatórios do antigo FUNDEF (Ensino Fundamental) aos profissionais do magistério, e não desejamos que outras desavenças jurídicas sejam criadas com a má utilização dos recursos do atual FUNDEB.
Brasília, 24 de novembro de 2021
Diretoria da CNTE
[1] RECURSO ESPECIAL Nº 1.554.168 - PB (2015/0222465-9) RELATOR : MINISTRO BENEDITO GONÇALVES RECORRENTE : WILMA PEREIRA CANDEIA RUFINO ADVOGADO : DAMIÃO GUIMARÃES LEITE - PB013293 RECORRIDO : MUNICIPIO DE QUIXABA PROCURADOR : SHARMILLA SIQUEIRA E OUTRO(S) - PB016564 ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. PROFESSOR MUNICIPAL. RATEIO DE VERBA DO FUNDEB ENTRE PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. INEXISTÊNCIA DE LEI AUTORIZATIVA MUNICIPAL. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA SEGUIMENTO. DECISÃO (...) Esta Corte Superior já firmou compreensão de que: "é realmente necessária a edição de lei estabelecendo critérios para distribuição dos recursos anuais totais do FUNDEB, destinados ao pagamento da remuneração dos profissionais do magistério em efetivo exercício na rede pública. A ausência de lei específica definindo critérios para o rateio dos recursos do FUNDEB desobriga o Município do pagamento. O Poder Judiciário não pode através de uma ação ordinária de obrigação de fazer suprir lacunas normativas e atuar como anômalo
legislador, só podendo corrigir a omissão se ajuizado o procedimento correto, qual seja, se interposto mandado de injunção" (REsp n. 1.408.795/PB, Rel. Ministro Og Fernandes, DJe de 25/02/2014). No mesmo sentido, com idêntico patrono: RESP n. 1.536.915/PB, Rel. Ministra Assusete Magalhães, DJE: 18/08/2015; RESP n. 1.551.425/PB, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe: 10/09/2015. Ante o exposto, nego seguimento ao recurso especial. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 26 de abril de 2017. MINISTRO BENEDITO GONÇALVES Relator. (STJ - REsp: 1554168 PB 2015/0222465-9, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Publicação: DJ 02/05/2017).
CNTE.