Especialistas e sindicalistas da educação
reunidos no Encontro do Movimento Pedagógico Latino-Americano, em Cuiabá,
alertaram que a maior ameaça à educação pública nos países da América
Latina é a terceirização dos serviços, que avança cada vez mais.
Organismos internacionais forçam os governos a privatizarem os sistemas
educacionais para garantir maior lucro comercial às empresas
transnacionais que atuam na área.
Esse alerta foi reforçado pelo coordenador
geral da IEAL (Internacional da Educação para América Latina), Combertty
Rodriguez, na manhã de sexta-feira (28), durante a mesa redonda que
debateu “A Experiência Educacional dos Povos Latino-Americanos e o
Desafio da Construção de uma Educação Libertadora”.
Segundo ele, o Banco Mundial e o BID (Banco
Interamericano para o Desenvolvimento) incentivam projetos de
financiamento para a educação pública diretamente aos municípios com a
exigência de que as empresas executoras de tais projetos sejam privadas.
“Temos que fazer o enfrentamento a essas tentativas de privatização e
comercialização da educação pública”, afirmou Combertty.
De acordo com ele, a IEAL faz um levantamento
em todos os países da América Latina para identificar os projetos desses
organismos financeiros para que as organizações sindicais possam
acompanhar todos os financiamentos realizados pelos dois bancos. “É
necessário pesquisar, estudar, conhecer mais e trabalhar com essas
informações no dia a dia. Temos que fortalecer as organizações sindicais,
pois vai haver mais repressão ao movimento. Por isso, a necessidade de
fortalecer também nossa capacidade sindical”, destacou.
A coordenadora da mesa, Fátima Silva,
secretária geral da CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em
Educação) e vice-presidente da IEAL, lembrou que as medidas do governo
ilegítimo de Michel Temer são de caráter neoliberais para favorecer a
terceirização e a privatização da educação pública no Brasil com a
entrada das grandes empresas de serviços na área educacional visando o
lucro apenas.
Os convidados internacionais e especialistas
na educação pública de outros países da América Latina também
demonstraram suas preocupações com o avanço da mercantilização no setor
educacional na região e alertaram para a necessidade de união nas ações
conjuntas entre nações latinas para fazer o enfrentamento a tais medidas
dos governos nacionais.
Chile - O professor chileno Juan Arancibia,
que trabalha na UNAM (Universidad Nacional Autónoma de México) há 35
anos, expôs a realidade educacional nos dois países. Em relação ao Chile,
ele fez um comparativo do sistema educacional implantado no regime
militar do governo de Pinochet, em que a educação privada era incentivada
pelo Estado, que conseguiu convencer a população de que esse modelo era
melhor em relação a educação pública, mas que visava apenas o lucro das
grandes empresas da área e a precarização dos profissionais.
Com a chegada do governo progressista de
Michele Bachelet, houve uma reforma educacional, em 2014, com apoio de
toda a sociedade, envolvendo os trabalhadores em educação e os
estudantes, em que a educação passa a ser um direito garantido pelo
estado. “A educação volta a ser pública e gratuita regulada pelo Estado,
porém são mantidas as escolas privadas e os alunos passam a receber
auxílio do governo”, explicou Arancibia, observando que ainda assim não
se eliminou o risco do lucro dos empresários nas escolas que recebem
auxílio financeiro do governo para o atendimento dos alunos.
México - No México, o governo neoliberal
prioriza a privatização da educação pública e persegue as organizações
sindicais que são contra ao modelo educacional implantado, inclusive com
prisão de lideranças. Arancibia revelou que o modelo segue a cartilha dos
organismos internacionais regidos pela meritocracia, como o uso das
provas internacionais do PISA, para avaliar a qualidade da educação no
país, o que é questionável por algumas organizações sindicais.
Uruguai - O representante uruguaio José
Oliveira Trillo, secretário geral da Fenapes (Federación Nacional de
Profesores de Enseñanza Seuncaria del Uruguay), fez rápido relato sobre a
história política recente e o modelo da educação em seu país. Disse
considerar os bons resultados apresentados ao fato de o Uruguai ser um
Estado laico e também a autonomia do sistema educacional. Lá a educação
pública gratuita é oferecida desde a educação infantil ao ensino superior
e é obrigatória a partir dos três anos de idade.
Oliveira destacou a importância do evento no
sentido de apontar caminhos e troca de experiências para que cada país
possa realizar diferentes ações que comtemple a realidade de seus povos e
nações, porém com enfoque na defesa da educação pública, “para evitarmos
o avanço da privatização do ensino em nossos países. A luta é comum na
educação pública, por isso somente com a união dos países
latino-americanos vamos conseguir abordar todos os aspectos, inclusive a
luta pelo fortalecimento da democracia”, completou.
Paraguai – Juan Gabriel Espínola,
representante da OTEP-A (Organización de Trabajadroes de la Educación del
Paraguay – Auténtica), iniciou sua fala contando um pouco da história dos
50 anos de ditadura militar no país, que teve um governo progressista
eleito pelo povo, o do Bispo Fernando Lugo, que sofreu um golpe e foi
deposto. Destacou que muitos dos políticos com importantes cargos têm
envolvimento com o contrabando de cigarros e tráfico de drogas no país.
Para ele, a falta de uma política de Estado séria tem dificultado o
desenvolvimento econômico do país e aumentado a dívida externa, em franca
ascensão.
Conforme Juan Gabriel, o atual governo
paraguaio é defensor das políticas neoliberais, que visam o lucro sobre
os serviços da educação, incentivando a terceirização do ensino no país.
“Não podemos derrotar o neoliberalismo se cada um for para um lado, por
isso temos que nos unir por meio dos movimentos latino-americanos e nos
fortalecermos para o enfrentamento. É preciso que as comunidades cresçam
e se projetem para poder se desenvolver, gerar empregos e se organizar
neste sentido”, ressaltou.
A mesa coordenada pela secretária geral da
CNTE, Fátima Silva, foi encerrada pelo professor e ex-presidente do
Sintep/MT, Júlio César Viana, que alertou aos profissionais da educação
para que eles promovam a verdadeira educação libertadora e emancipadora
nas escolas públicas. “O nosso desafio está em conseguirmos transformar
as pessoas por meio da educação. É um processo de superação, rebeldia e
subversão que deve iniciar por nós mesmos”, declarou, acrescentando que a
ensino deve ir além dos livros didáticos.
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